O mesmo

Hoje, andando por aí, encontrei uma pessoa que fez parte do meu passado.

Nunca brigamos, nunca nos desentendemos, nunca trocamos farpas. 

Deus me livre, nem em sonho isso.

Aliás, muito pelo contrário: essa pessoa costumava ser minha melhor amiga, há alguns anos.

Quis o destino que muitas coisas mudassem, na minha vida e na vida dela. Pessoas entraram, pessoas saíram, coisas aconteceram, coisas deixaram de acontecer. Faz parte do show.

O único problema é que o que tínhamos antes - uma bela amizade, por sinal - se perdeu por aí. Deve estar nos escombros de uma colisão de satélites orbitantes da suposição do que deveríamos ter feito para manter a amizade e do que de fato fizemos (a propósito, contando aqui nos dedos, não fizemos nada).

Por isso, nos distanciamos. E nunca mais nos falamos, tampouco nos vimos.

Mas hoje, sem esperar que isso fosse ocorrer, acabamos nos trombando num sinal fechado qualquer do trânsito dessa louca cidade. Coisa de 2 minutos, talvez menos.

"Como você tá, meu?"

"Que saudades, nunca mais eu vi você!"

"Fiquei sabendo que vai casar, é? Que reviravolta!"

"E tua irmã, tua mãe, teu pai? Todos bem?"

"Impressionante como passou o tempo e você continua o mesmo."

"Tchau, beijo, foi ótimo te rever!"

///

"Impressionante como passou o tempo e você continua o mesmo. Você continua o mesmo. Você, o mesmo. O mesmo."

***

Eu gostaria de ter dito o quanto incomodou esta última parte da nossa breve conversa.

Gostaria de ter retrucado, argumentado, provado um ponto, mostrado números e indicadores de que não, eu não continuo o mesmo. Mas nem fodendo. Nem por um par de caralhos, se me permite dizer.

Só que não tinha tempo pra isso. O sinal ficou verde e a gente se despediu ali mesmo, do jeito que deu.

Gozado isso. Como é que uma pessoa que não me vê há anos consegue me avaliar por menos de 2 minutos e se julgar tão correta assim no seu diagnóstico?

Restou o incômodo na minha cabeça.

Aquela sensação de algo não resolvido que ficou pra trás. E vai ficar, pelo jeito, por mais alguns anos.

Talvez eu esqueça daqui a pouco. Mas, conhecendo meu jeito, quem sabe eu nem durma hoje. Provavelmente vou ouvir um zunido lá da alma me acalmando e dizendo que tudo bem se eu realmente continuar sendo o mesmo que costumava ser antigamente.

O que eu queria mesmo era me convencer de que já não sou mais quem era. Que sou melhor hoje, mais maduro, mais forte.

"Você continua o mesmo."

Pff, corta essa.

Comentários

  1. O maior erro de quem muda é achar que os outros continuam igual. Muito bom seu texto.
    Beijos rimados pra você :*

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Faça a festa.

Postagens mais visitadas